Dos Cônsules Honorários

 

"O Cônsul é um agente internacional de um Estado nomeado para exercer funções de natureza jurídico-pública (...) e para, nestes domínios, representar o Estado que o nomeia no território do outro Estado com o expresso consentimento deste" ou, como ensina Wladimir Brito, o "Cônsul, embora não seja um representante com poderes para negociar ou vincular internacionalmente o seu Estado, não deixa de ser um orgão deste que nos serviços consulares dirige as suas relações internacionais em áreas específicas e bem delimitadas."

O Estado atribui assim ao seu agente um mandato representativo, concreto e delimitado territorialmente.

O mandato representativo corporiza-se sob a forma de Carta Patente ou instrumento similar do qual consta, nomeadamente, o nome do Chefe do Posto Consular, sua sede (Posto Consular) e respectiva área de jurisdição consular.

Tal mandato permitirá então ao Chefe do Posto Consular exercer funções na área de jurisdição consular após autorização (exequatur) do Estado Receptor.

Cabe ao Chefe do Posto Consular superintender e administrar as instalações consulares e a respectiva área de jurisdição.

O princípio da soberania justifica que a alteração da sede do Posto Consular, a abertura de uma Agência Consular ou de um escritório fora da sede do Posto Consular careça (além da autorização do Estado que envia) de consentimento prévio e expresso do Estado Receptor.

É na área consular que se desenvolve o quid das funções de Cônsul Honorário dentre as quais se contam o direito a ser informado pelo Estado Receptor quando na sua área consular um nacional do Estado que envia for preso ou detido, o direito de visita ao nacional do Estado que envia preso na sua área consular e a obrigação de organizar a sua defesa, se necessária, o direito a receber, pelo Estado Receptor, informação "sem demora" da morte na área consular de cidadão nacional, o direito a ser informado pelo Estado Receptor da necessidade de nomeação de tutor ou curador a menor ou incapaz nacional do Estado que envia, entre outras:

"O direito internacional público, em ordem a facilitar a prossecução de fins de interesse público, impõe ao Estado Receptor o dever de informar o Posto Consular competente também da ocorrência daqueles factos."

No exercício das suas funções o Cônsul poderá comunicar com as autoridades locais competentes da sua área de jurisdição consular.

Se o Chefe do Posto Consular se encontrar impedido de exercer as suas funções poderão as mesmas ser desempenhadas por um chefe interino após comunicação prévia e prévia anuência do M.N.E. Receptor.

O exercício de funções fora da respectiva área de jurisdição consular só poderá ocorrer se cumulativamente se verificarem duas condições:

A) ocorrendo circunstâncias especiais; e

B) obtido prévio consentimento do Estado acreditador

A competência funcional determina-se, pois, e quanto ao território, pela área geográfica pré-determinada que se não for observada desvirtua o fim visado e é sindicável: é uma regra do direito internacional geral (costumeiro) universalmente reconhecida e aceite, pelo que a generalidade das convenções consulares a consagram.

Para o exercício das funções consulares o Estado acreditador concede ao agente alguns privilégios e imunidades, concessão essa que traduz o respeito pela dignidade e a independência do Estado acreditante tradutor do princípio da reciprocidade e do princípio da igualdade entre Estados.

A adopção da concepção funcional origina restrições ao princípio da imunidade e ao princípio do privilégio.

O Cônsul, por regra, não está protegido senão em função do acto institucional executado na sua área consular, podendo, fora dela, ser submetido à jurisdição quer judiciária quer administrativa do Estado acreditador. (a contrario sensu, art.43º nº1 da CVRC).

"Considerando a abordagem funcional, para averiguar se o Estado acreditador pode aplicar a sua Jurisdição a um acto de um Cônsul, é necessário perguntar se esse acto foi exercido no desempenho das suas funções. Caso a resposta seja positiva, o Cônsul gozará de imunidade dentro dos limites impostos pelo nº2 do artigo 43º da CVRC, caso contrário, o acto praticado pelo Cônsul é sindicável também junto das instâncias do Estado acreditador."

Assim, devido ao princípio imperativo do exercício de funções na "Área de Jurisdição Consular" (previamente determinada), a prática de qualquer acto fora dessa área acarretará um acto de esvaziamento funcional para o Posto Consular acreditado na área, sendo certo que o acto em si é idóneo e tem aptidão, ainda que potencial, para traduzir usurpação de funções, abuso de designação e, consequntemente, perturbação da estabilidade da função devido a desorganização institucional, com a introdução de um elemento novo que altera a ratio da criação e aceitação do Posto Consular na área onde ocorreu a intromissãoo que tudo pode, eventualmente, traduzir simultaneamente ilícito disciplinar e penal.

O exclusivo do exercício de funções na Área Consular implica o dever de absoluta abstenção de qualquer outro Chefe de Posto Consular (de área diversa), salvo, repete-se, expressa determinação do Estado acreditante e expressa autorização do Estado acreditador.

A prática de um acto por agente fora da sua Área de Jurisdição traduzirá também um acto de confusão, acto que não é necessário que ocorra de facto, mas apenas que haja o perigo de ele se verificar.

Também a avaliação da confudibilidade é sindicável.

Acresce que o Cônsul que exerça funções fora do âmbito da circunscrição territorial sob sua jurisdição ofende o Estado acreditador já que lhe cabe "o dever de respeitar as leis e os regulamento do Estado receptor" o qual, a pedido do Estado que envia, permitiu o exercício funcional exclusivamente na área previamente definida.

 

Paulo Patrício, Cônsul R. D. São Tomé e Príncipe

in Associação Consular do Porto, 2011

 

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